Por João Maurício
José Timóteo de Matos foi meu colega de trabalho em 1976, na Escola Preparatória da Benedita, onde era presidente do Conselho Diretivo. Dirigiu a Escola num tempo difícil. Não havia cantina, nem ginásio, nem bar, nem biblioteca. Dois ou três “arruaceiros”, por motivos políticos fizeram-lhe a vida negra. Timóteo era um diplomata, nada sectário, espírito aberto, inteligente, solidário. Um senhor que, com a sua bonomia, conseguia fazer pontes. E até fez as pazes com quem não merecia.
A vida tem destas coisas: não o vi durante quase trinta anos. Até que, em 2005, encontrei-o por mero acaso, em Porto de Mós. Foi aquele abraço!
Voltámos a perder o rasto um do outro. Mas um dia, em 2013, telefonou-me para me oferecer o seu livro “Nada a Temer, Excepto as Palavras”.
Foi uma despedida. José Timóteo tinha uma doença grave. Partiu poucos meses depois. O livro é uma autobiografia onde se fala de tudo e de nada.
Obrigado pela referência que nele me é feita.
Um dos capítulos é dedicado ao “Tibúrcio”, já desaparecido, uma das figuras típicas da nossa região. Lembro-me bem dele!
Todos nós estamos “formatados” por esta sociedade dita moderna e, por isso, os “Tibúrcios” foram desaparecendo. Nasceu na zona serrana da freguesia de Aljubarrota, pobre, indefeso e cresceu sem manhas. Era muito conhecido, não por ser político, rico ou jogador de futebol, mas por ser diferente.
Esteve internado no Asilo de Alcobaça. Diz o povo e bem, que “galinha do campo não quer capoeira” e a dado momento fugiu da instituição.
Amigo dos cães e dos gatos. Nunca teve um trabalho fixo. Tornou-se engraxador, mas com pouco jeito. Às vezes, os clientes saíam com as meias e sapatos engraxados por igual e, por isso, tinha pouca clientela. Montou o negócio junto a Farmácia Campeão e ia à boleia para a Benedita, Rio Maior e Caldas da Rainha.
Ainda há, por cá, quem se lembre dele. Dormia em barracões, casas em ruínas, telheiros ou nas entradas dos prédios.
Quando tinha algum dinheiro, ia à taberna alcobacense “O Beco do Grilo” matar a sede. Recebia umas moedas ou cigarros. Quando lhe entregavam um maço do S. G. Gigante, sorria como se tivesse recebido ouro.
O Tibúrcio levou muitos pontapés da vida, mas não se lamentava, aceitava-a com resignação. Engraxador não era a sua especialidade, pelo que optou por fazer recados: comprar o jornal, pôr cartas no correio e outras coisas ditas banais.
E lá foi vivendo até que partiu. Nesse dia, Alcobaça ficou mais pobre – morreu não um homem rico, mas um homem bom!
Nota – a ilustração, da autoria de Mónica Marques, foi retirada, com a devida vénia, do livro referido anteriormente. Mónica era, na altura (2013), aluna da Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra.