Por João Maurício
Primeira Parte
Agora que estamos na época balnear, surgem na minha memória cenas da Nazaré de há mais de sessenta anos. Ainda não se falava do Algarve, nem das praias de Cabo Verde ou do Brasil, já a então vila piscatória era o centro dos mundos estremenho e ribatejano que, nos meses de Verão se uniam numa simbiose perfeita.
A Nazaré sempre foi assim: uma praia da classe mais popular, ao contrário das suas vizinhas, S. Pedro de Moel, sede da burguesia industrial marinhense ou de S. Martinho do Porto, pouso das aristocracias alfacinha e alentejana, tão bem descrita num dos livros chamados “light”, de Margarida Rebelo Pinto.
A pesca hoje está quase moribunda nessas paragens, mas nem sempre foi assim. Todas essas memórias foram descritas por Raul, em Brandão, em “Os Pescadores” (1923). Diz-nos o autor que eram “elas”, (as Nazarenas), que distribuíam o pescado numa vasta área entre Leiria e Santarém, fenómeno que quase chegou aos nossos dias.
As que eu conheci, nomeadamente a “Ti Alice”, usavam na invernia, uma capa que as tornava austeras e que lhes escondia o corpo. Rezavam na praia, enquanto aguardavam a chegada dos homens que vinham da pesca. Não havia tratores, mas juntas de bois que puxavam os barcos e, depois, cordões humanos traziam as redes para o areal.
Os homens nazarenos faziam do barrete uma peça fundamental da sua indumentária diária. Nos dias de festa, as mulheres usavam os tradicionais lenços coloridos e as sete saias com os seus aventais bordados e dos tamancos que chamavam a atenção dos forasteiros.
No dia a dia, era a Nazaré da pobreza, do sofrimento, da arte xávega, do típico, dos barquinhos a remos e das traineiras e, também, das pessoas descalças.
A vila era a terra mais importante da costa litoral centro. Havia, nessa altura, mais do que hoje, um triângulo famoso: Nazaré, Alcobaça e Fátima. O turismo dava os primeiros passos e, por isso, iam aparecendo as belas francesas, tipo Sylvie Vartan que, com os seus fatos de banho coloridos e já um pouco ousados, contrastavam com as vestes escuras daquelas gentes.
Lembro-me dos carrinhos/bicicletas de gelados. As tabernas estavam no auge.
(Continua)